É difícil acompanhar o ritmo de Antonio Maiolica. Passeando pelas mesas do salão de seu restaurante, o Temperani Cucina, em São Paulo, o italiano executa suas tarefas com um dinamismo invejável.
Para este editorial inspirado pelo Dia dos Pais, o chef se empolga ao trazer pratos que marcaram sua trajetória e representam sua juventude em Salerno, cidade litorânea na região da Campânia, Sul da Itália.
No menu, faz questão de apresentar receitas como o Gnocchi alla Sorrentina e as flores de abobrinha que devorava na infância. Mas diferentemente de muitas das histórias que crescem a partir de uma visão romântica da cozinha — em que chefs se apaixonam pela profissão por causa das refeições feitas em mesas cheias e das matriarcas da família — o que motivou Antonio foi sua inquietude. Na infância, amava uma boa macarronada, mas passava longe dos preparos que aconteciam na cozinha: queria mesmo era jogar bola e videogame.
Seu primeiro contato com a hospitalidade aconteceu aos 18 anos. Incentivado pela mãe, partiu para o norte do país para trabalhar em um hotel cercado pelas montanhas. Começou atuando como “faz-tudo”, de garçom a recreador — ali, se encantou pela arte de servir.
Após a experiência inicial, sua mãe, com saudades do filho e ansiando para que ele permanecesse em sua cidade natal, o convenceu a retornar. Antonio bem que tentou se adaptar à rotina pacata, mas trabalhar em frente ao computador não deu muito certo. Logo conseguiu um emprego como garçom em um restaurante na Costa do Cilento, não tão longe da família, e ali sentiu-se em casa.
“Mas todo mundo me falava que eu tinha que estudar, que aquela vida de restaurante não iria dar certo”, recorda. Assim, foi cursar Economia em Rimini. A escolha definitiva pela cozinha veio mais tarde, quando se dedicava apenas aos estudos e o dinheiro começou a faltar.

“Nessa época, não sabia nem fritar um bife”, confessa. Para não interromper a faculdade, buscou um trabalho em um restaurante e encontrou sua primeira grande mentora, uma chef de cozinha que lhe disse que tudo o que tocava se transformava em algo bom. A frase se tornou um marco, e seu caminho foi definido a partir de então.
O desassossego que o levou à cozinha também o empurrou para o mundo. Primeiro, Playa del Carmen, no México, onde viveu por dois anos e assumiu seu primeiro cargo de chef, descobrindo ingredientes distantes dos sabores da Europa.
“Mas eu sou um cara que toda vez que estou bem, na zona de conforto, eu não quero ficar. Eu quero problemas.”
Antonio Maiolica
“Eu tinha um plano traçado. Queria ir ao México, Peru, Espanha… E depois voltar com uns 35 anos de idade para abrir meu restaurante na praia.” Porém, Nova York surgiu como um divisor de águas. Um convite para trabalhar nos restaurantes da cidade veio como uma oportunidade de mergulhar na contemporaneidade da gastronomia mundial, capaz de ampliar seus horizontes durante cinco anos. “Mas eu sou um cara que toda vez que estou bem, na zona de conforto, eu não quero ficar. Eu quero problemas.”
Quando seu visto estava prestes a vencer, veio a ideia de viajar de férias ao Brasil durante a Copa do Mundo de 2014. Apaixonado por futebol, chegou sem planos de ficar, mas se surpreendeu com o cenário gastronômico. Lembra que, à época, o que se entendia por culinária italiana por aqui estava muito distante de sua percepção. A frustração virou combustível para uma missão pessoal.

“Não era tão bom igual hoje. Pensei: ‘Nossa, como esses caras fazem essas carbonaras assim?’. Agora, vou te falar, tem muito restaurante italiano bom em São Paulo. Se come muito bem a massa, a pizza… Mas 11 anos atrás era uma porcaria.” Irreverente e sem filtro, o chef é detentor de uma honestidade rara. Motivado a mudar o cenário paulistano, decidiu ficar (só não sabia que ainda estaria aqui 11 anos depois).
Passou por casas como Ecully, Forquilha e Tappo. Apesar do bom resultado na cozinha, fora delas a situação ainda era um tanto caótica: “Eu brigava com os clientes. Fazia massa al dente, e eles reclamavam. Eu dizia que na Itália era assim, e eles falavam que ‘estavam pagando’. Respondia que o chef era eu, que se ele não quisesse comer, tinha outros lugares para ir. Eu era muito ignorante, quer dizer, não ignorante, é que eu queria fazer [as receitas] para as pessoas conhecerem. Hoje, se eu servisse a massa muito cozida, elas provavelmente reclamariam, tudo mudou.”

Em 2019, já mais calmo e com o cenário gastronômico da cidade transformado, ganhou reconhecimento no comando do Antonietta Cucina, quando recebeu o prêmio de Melhor Trattoria pela VEJA SÃO PAULO COMER & BEBER. Em seguida, a pandemia trouxe incertezas e até a vontade de mudar-se novamente. “Eu tive que me virar, vender coisa em casa, depois fui trabalhar numa fazenda de búfalas em Jaú…”, recorda.

O que mudou tudo foi um convite para assumir o Temperani Cucina, restaurante pertencente ao Vila Anália, complexo gastronômico na Zona Leste de São Paulo. Com a casa, veio também a ideia de gravar vídeos.
“Começou como uma brincadeira, queria fazer um registro das receitas. Nunca imaginei que se tornaria algo desse tamanho. Acho que os brasileiros gostaram porque viam preparos que suas famílias faziam também.”
Hoje, o chef acumula mais de 1 milhão de seguidores. “Quando veio esse reconhecimento, tudo fez sentido na minha trajetória, achei que iria conquistar o respeito que tanto busquei. Mas agora as pessoas me veem e falam: ‘Você é o chef do TikTok?’”, relata com uma indignação bem-humorada.
Atualmente, assina o cardápio do grego MII Rooftop, também no complexo da Zona Leste, do Temperani Trattoria (Itaim Bibi) e do Temperani Amalfi (Shopping Cidade Jardim).
Que venha a calmaria

“Com certeza neste Dia dos Pais as meninas vão ficar comigo, eu não tive essa tradição, mas quero que elas tenham”
Antonio Maiolica
Sempre curioso e inconformado, Antonio se diz — acredite ou não — em sua fase mais tranquila. Pai de duas meninas de 7 anos, as gêmeas trouxeram uma nova perspectiva: menos rigidez, mais calma, e a vontade de ensinar às filhas o valor das tradições que ele mesmo ignorava no passado.
“Eu sempre fui maluco por trabalho, é algo que fica acima de qualquer coisa na minha vida; sempre passei as datas festivas trabalhando. Essa é uma coisa ruim dessa profissão, viu? Não tem como dedicar meia vida, tem que ser uma vida inteira. Mas agora estou tranquilo, nem brigo mais na cozinha, estou começando a colher os frutos de tudo que fiz.
Com certeza neste Dia dos Pais as meninas vão ficar comigo. Eu não tive essa tradição, mas quero que elas tenham.” A depender dos sabores à mesa, as boas memórias estão garantidas.
CRÉDITOS DE PRODUÇÃO
Texto Marina Marques
Fotos Bruno Geraldi
Edição de Arte Catarina Moura
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