Era 11 de maio de 2023, às 19h12, quando Fabiane Berta foi tomada por uma urgência. A médica havia assistido ao documentário A Mente na Menopausa e o conteúdo a deixara inquieta, mas tão inquieta, que precisava fazer alguma coisa.
Com papel e caneta em mãos, enquanto aguardava seu pedido de delivery (feito no horário exato acima), pôs-se a escrever. Antes mesmo de a comida chegar, já sabia que iria criar um movimento capaz de transformar o cuidado com a saúde feminina.
Filha de um mecânico e de uma artista plástica, Fabiane cresceu em um ambiente onde passar horas na garagem inventando objetos com martelos, pneus e pregos parecia natural. “Lembro de dizer: ‘um dia vou construir algo que vai mudar o mundo’.” Na infância, isso significava ser cientista e trabalhar na NASA. Mais tarde, porém, entendeu que poderia transformar vidas por outro caminho: a medicina.
A médica se especializou em ginecologia na tradicional Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Durante a residência, aprendeu especialmente sobre temas ligados ao ciclo reprodutivo.
“Temos um sistema muito voltado para a adolescente que precisa evitar a gravidez e, depois, para a adulta que deseja engravidar. Desse ponto até a chegada do geriatra, praticamente metade da vida feminina fica esquecida”, diz.
A invisibilidade da menopausa
Se dentro das salas de aula a menopausa era pouco estudada, fora delas era tabu. Quando assistiu ao documentário, percebeu uma realidade incômoda: milhões de mulheres enfrentam transformações profundas com o fim da vida reprodutiva sem informação, acolhimento ou cuidado adequados. E mais: os profissionais não estão suficientemente preparados para diagnosticar e tratar corretamente a menopausa.
“Somos 45 milhões de brasileiras entre 35 e 65 anos. Metade do país é mulher, e a outra metade, filhos delas. Ainda assim, a menopausa é tratada como invisível. O estereótipo social reforça medo, abandono e envelhecimento. Muitas delas relatam que ouviram do médico: ‘Isso é psicológico, é frescura’. Ao mesmo tempo, em 2023, o Brasil bateu recorde de suicídios entre mulheres de 48 a 54 anos. A menopausa não é doença, mas pode adoecer.”
A construção do MyPausa
Dessa reflexão nasceu o MyPausa, iniciativa estruturada em três frentes: qualificação médica, espaço de escuta para as mulheres e produção de dados. O primeiro passo do projeto é mapear a menopausa no Brasil. “Só com dados consistentes é possível levar propostas sérias às entidades médicas e ao governo. Não dá para falar em menopausa como se o Brasil fosse homogêneo. A experiência no Sul não é igual à do Nordeste, nem à do Centro-Oeste. Nós precisamos entender quem somos para acertar o melhor tratamento para cada mulher.”
Com apoio da Science Valley, um dos maiores grupos de pesquisa do mundo, o MyPausa está mapeando mulheres nos 27 estados. O estudo está em fase de seleção dos centros de pesquisa participantes. A ideia é entrevistar 1.592 pessoas, que representem todas as camadas da população brasileira.
O Brasil caminha para se tornar um país cada vez mais envelhecido e isso também significa que cada vez mais pessoas vão experimentar a menopausa. Por isso, Fabiane olha com urgência para o futuro. “Qual país queremos em 2050? Um lugar onde a mulher sofra em silêncio ou onde tenha protagonismo, saúde e valorização?”, questiona. Para ela, se voltarmos o olhar para esse grupo, chegaremos à segunda alternativa.
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