Sem rodinhas, sem você
Quando escolhi você para andar
de mãos dadas na rua, senti um pouco de vergonha: estou tentando aprender a andar de amor e você
é minha bicicleta de rodinhas.
Fica feio uma mulher adulta como eu, com bicicleta de rodinhas e buzina desafinada pela ciclovia?
Ou fica mais feio ainda levar tombos imensos achando saber o que não sei?
Acalma-me saber que medo de amar é a coisa mais nova e mais velha do mundo.
Velha porque morre sempre, nova porque nasce sempre.
pedalo pedalo pedalo
Já posso andar sem as duas mãos agora! Veja! Estou descendo a ladeira e até aprendi a fazer curva.
É hora de tirar as rodinhas, digo.
Você diz que não não não.
— melhor manter as rodinhas.
É por você. É preciso cuidar de você.
Miro seus olhos-faróis cintilantes de mentira.
Brilham, pois refletem os meus.
As luzes vinham de mim, afinal.
Só de mim?
Buzino.
Você disfarça.
Cheio de rodinhas e de freios.
Tem medo que te ocupe demais?
Que te leve muito veloz pra passear?
Tem medo de cair comigo no buraco?
De atravessar aquela rua movimentada?
Tem medo de ir um pouco mais longe do que seu bairro?
Tem medo de achar meio legal o vento?
Desço e encaro você, percebo agora as fitinhas coloridas no guidão. Estará pronto algum dia?
Volto a montar, pois é irresistível.
Suspiro.
Não se obriga ninguém a sentir o que não se sente.
Mesmo que as peles insistam num toque quase involuntário.
Mesmo que o certo pareça sentarmos um ao lado do outro e falarmos bem de pertinho.
Mesmo que o certo pareça o abraço que acolhe o sonho.
O encaixe.
Não há matemática.
Suspiro.
Não se pode obrigar ninguém a querer alguém.
Mesmo que…
Desperto do breve delírio.
Estou no meio da rua.
Alguém grita um “sai da frente”.
Olho para os lados e parece que estão velozes os outros veículos.
Alguns com motores e espelhinhos e luzes de proteção.
Proteção.
Eu estava me protegendo da queda, mas você…
Você está se protegendo de mim?
Agora sinto medo do seu medo e me calo.
Você diz “aproveita o passeio”,mas eu só ouço:
fom fom
É hora de partir, então.
Aceno definitiva. Acelero.
Sem rodinhas e sem você.
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