Sou mega fã de Ted Lasso e estou naturalmente feliz com seu retorno em 2026. As gravações já começaram, o que significa que poderemos reencontrá-lo logo no início do ano. A minha teoria inicial era a de que Ted voltaria como técnico da seleção masculina americana, uma vez que a Copa do Mundo de 2026 será nos Estados Unidos, mas outros foram mais certeiros pegando a dica da última cena com Rebecca Welton e Keeley Jones, as principais personagens femininas da série, na qual elas se associam para investir na liga feminina inglesa. Isso mesmo, há um AFC Richmond com jogadoras mulheres.
Com a primeira imagem já divulgada, o técnico mais carismático da televisão está oficialmente de volta. Depois de três temporadas à frente do AFC Richmond, ele voltou para o Kansas para ficar perto do filho. Ainda não sabemos como, mas veremos que Ted Lasso retornará à Inglaterra em uma nova missão: ajudar um time de futebol feminino da 2ª divisão a conquistar o acesso à elite.
A informação acendeu também um debate mais amplo — sobre o lugar do futebol feminino hoje e como a cultura pop pode influenciar sua popularidade e valorização. A escolha de mudar o foco da série é significativa. Em sua primeira fase, Ted Lasso conquistou o público ao subverter a lógica das histórias esportivas.
Em vez de um técnico vencedor, ganhamos um treinador que desconhecia completamente o esporte — um americano vindo do futebol universitário que, em vez de táticas, oferecia empatia, escuta, paciência e humor. O sucesso da série não estava apenas nas vitórias em campo, mas no crescimento dos personagens, na construção de vínculos e na coragem de tratar temas como ansiedade, divórcio, masculinidade tóxica e depressão.
Agora, em 2025, Ted retorna num novo cenário, que reflete um momento de transição e crescimento real do futebol feminino ao redor do mundo. Se na primeira temporada o conflito era entre culturas esportivas e pessoais, agora a tensão pode surgir entre visibilidade e invisibilidade, entre reconhecimento e resistência. Afinal, por mais que o futebol feminino esteja mais presente nas mídias e nos estádios do que nunca, a desigualdade estrutural em relação ao masculino ainda é gritante — tanto na Europa quanto no Brasil.
O cenário europeu: um salto visível, mas desigual

Nos últimos três anos, o futebol feminino europeu passou por um verdadeiro boom. Após o sucesso da Euro 2022, vencida pela Inglaterra diante de mais de 87 mil torcedores em Wembley, a UEFA e as federações nacionais aceleraram seus planos de investimento e profissionalização. Em 2024, a WSL (Women’s Super League) inglesa assinou um novo contrato multimilionário de direitos de transmissão com a BBC e a Sky Sports, elevando o número de jogos televisionados e, com isso, a exposição das atletas.
Clubes como Chelsea, Arsenal, Manchester United e principalmente o Barcelona Feminino transformaram suas equipes femininas em potências globais. O Barça venceu duas Champions League consecutivas (2023 e 2024), bateu recordes de público e audiência, e se tornou referência em gestão, marketing e formação de atletas. Os jogos decisivos do time atraem mais de 50 mil torcedores e são acompanhados ao vivo por milhões de espectadores.
Mas o sucesso tem suas camadas. Em ligas menores ou países sem tradição, como Hungria, Eslováquia ou até mesmo a Itália, o profissionalismo ainda engatinha. Salários são baixos, contratos curtos e muitas jogadoras dividem a rotina de treinos com trabalhos extras. A UEFA estima que apenas 25% das atletas profissionais da Europa ganham o suficiente para viver exclusivamente do futebol.
E no Brasil?
Em solo brasileiro, o avanço é igualmente evidente, ainda que mais desigual. Em 2025, completam-se 10 anos desde que a CBF, pressionada pela Conmebol, tornou obrigatória a existência de times femininos profissionais para que clubes disputassem competições continentais. Desde então, o Brasileirão Feminino A1 se consolidou, com apoio crescente de patrocinadores, transmissões regulares e públicos cada vez mais expressivos em partidas decisivas.
Clubes como Corinthians, Ferroviária, Palmeiras e Flamengo lideram em estrutura, títulos e investimento. Ainda assim, a diferença para o masculino é abissal. Segundo dados de 2024, mais de 70% das jogadoras da Série A1 recebem menos de dois salários mínimos e enfrentam dificuldades de acesso a centros de treinamento, logística e acompanhamento médico equivalentes aos dos homens.
Por outro lado, há boas notícias: a CBF mantém, desde 2022, a equiparação das diárias e prêmios pagos às seleções masculina e feminina. A seleção, agora sob nova gestão técnica, busca renovar sua identidade após a aposentadoria de Marta, ícone histórico do futebol mundial. Novos nomes como Ary Borges, Geyse, Adriana e Kerolin despontam em clubes europeus e ajudam a consolidar o Brasil como celeiro de talento.
Iniciativas paralelas, como torneios escolares, ligas universitárias e incentivo à formação de treinadoras, também têm crescido. Ainda é cedo para falar em paridade, mas a roda gira — e mais rápido do que antes.
O papel de Ted Lasso

Neste contexto, a decisão dos criadores de Ted Lasso de explorar o futebol feminino soa quase natural. A série sempre tratou de transformação: dos personagens, dos times, dos valores. Levar esse olhar para a realidade das mulheres nos esportes é mais do que uma tendência; é uma necessidade. E há um terreno fértil para criar novos personagens, novas histórias e, quem sabe, provocar mudanças no imaginário coletivo.
Se Ted teve sucesso ao conquistar um time masculino descrente com gentileza e otimismo, o que ele encontrará ao trabalhar com mulheres acostumadas a lutar por cada centímetro de espaço e respeito? O desafio agora é outro — menos sobre ensinar táticas e mais sobre reconhecer trajetórias. Não se trata de um “herói que salva” um time feminino, mas de um treinador que pode aprender, escutar e talvez — como sempre — inspirar.
Culturalmente, Ted Lasso pode ajudar a mudar o tom da conversa. Pode levar o público a se emocionar com narrativas reais e cruas que há muito esperam visibilidade. Pode provocar novas perguntas: por que ainda tratamos o futebol feminino como “alternativo”? Por que não torcemos com a mesma paixão por elas?
Em última instância, a nova temporada de Ted Lasso talvez não seja sobre vitórias ou divisões de acesso. Talvez seja sobre algo maior: sobre criar um espaço onde o futebol, independentemente de quem o joga, seja tratado com o mesmo respeito, investimento e amor. E onde todos — homens e mulheres — possam, juntos, simplesmente acreditar.
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