Nos últimos dez anos, o número de diagnósticos de HIV entre pessoas com mais de 60 anos cresceu quase 416%, segundo dados do Ministério da Saúde. O aumento expressivo tem chamado a atenção de profissionais da área, que destacam a necessidade urgente de ampliar a informação e os cuidados voltados à população mais velha.

Em entrevista à CLAUDIA, o infectologista e gerente médico da GSK, Roberto Zajdenverg, aponta que a desinformação ainda é um dos principais fatores para esse crescimento. “Muitas mulheres acreditam que o HIV não é uma preocupação nessa fase da vida, e muito menos algo que as atinja diretamente. Mas o que temos visto é justamente o oposto”, afirma.

Sexualidade madura ainda é tabu

Embora temas relacionados à sexualidade sejam tratados com mais naturalidade hoje, grande parte das mulheres mais velhas cresceu em contextos conservadores, com pouco espaço para falar sobre desejos e práticas sexuais. Isso contribui para a vulnerabilidade dessa faixa etária diante de infecções sexualmente transmissíveis.

“Muitas não utilizam a forma mais simples de prevenção, o preservativo. Sentem vergonha de sugerir o uso e, muitas vezes, não se sentem à vontade para conversar sobre isso com seus parceiros”, explica o médico.

Além disso, Roberto destaca que até mesmo profissionais de saúde carregam esse estigma, o que limita o acesso a orientações adequadas. “Não é vergonha nenhuma o profissional não saber de tudo. Mas é necessário, pelo menos, tocar no assunto e encaminhar para quem está capacitado para prestar o atendimento.”

Liberdade sexual exige mais informação

Outro fator que contribui para o crescimento dos casos está ligado à maior liberdade sexual que muitas mulheres vêm assumindo. Diferente de décadas passadas, hoje é mais comum que mulheres com mais de 60 anos tenham vida sexual ativa, inclusive com múltiplos parceiros. Com o tempo, elas passaram a assumir o controle de seus desejos, frequentar novos ambientes, explorar aplicativos de relacionamento e ampliar suas possibilidades.

“Práticas que antes eram associadas apenas aos jovens também fazem parte da vida de muitas mulheres maduras. E com a diversidade de parceiros, é fundamental reforçar a importância da prevenção”, pontua o infectologista.

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O médico também chama atenção para o papel das mulheres mais jovens nesse contexto. Segundo ele, muitas vezes o preconceito parte justamente da nova geração, que não considera a possibilidade de que suas mães, tias ou avós mantenham uma vida sexual ativa.

“O que vemos são mulheres viúvas ou separadas, em busca de uma nova vivência amorosa, mas sem o acesso à informação adequada sobre métodos de prevenção, que vão muito além do uso do preservativo”, afirma.

Atualmente, é natural que mulheres mais velhas busquem novas alternativas de relacionamentoFreepik/Reprodução

Prevenção e testagem

Roberto destaca que, além da camisinha, há outras formas de proteção oferecidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Uma delas é a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP), um medicamento que, se tomado corretamente, reduz significativamente o risco de infecção pelo HIV – seja em relações sexuais ou no uso de drogas injetáveis. “A maior parte das pessoas nem sabe que tem isso disponível nas unidades públicas de saúde do seu próprio bairro”, alerta.

Apesar disso, o uso do preservativo continua essencial, especialmente por também proteger contra outras infecções sexualmente transmissíveis (ISTs). Ele ainda lembra que há a opção da camisinha feminina, que garante mais autonomia às mulheres na hora de se protegerem, sem depender do parceiro.

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Outro pilar no combate à disseminação do HIV é a testagem regular. Zajdenverg reforça que realizar exames regularmente é uma das formas mais eficazes de interromper a cadeia de transmissão. “Hoje, é extremamente simples fazer o teste. Ele está disponível em unidades básicas de saúde em todo o Brasil, e não estamos falando só de um grupo economicamente favorecido”, afirma.

A ausência de testagem, além de dificultar o diagnóstico precoce, contribui para a subnotificação dos casos. Isso impede que as autoridades de saúde tenham um retrato fiel da situação em cada região, comprometendo políticas públicas e investimentos necessários para o enfrentamento da doença.

O HIV pode permanecer assintomático por anos, o que dificulta ainda mais o diagnóstico. Em alguns casos, os sintomas iniciais se assemelham aos de uma gripe leve, passando despercebidos. “Visualmente, não há qualquer alteração no corpo que indique a presença do vírus. Por isso, muitas pessoas sequer desconfiam que estão infectadas”, alerta o especialista.

Tratamentos e nova possibilidades

Receber um diagnóstico positivo para o HIV ainda é um tabu para muitas mulheres, mas Roberto reforça que isso não deve ser motivo de vergonha. Embora ainda não exista cura, os tratamentos atuais são altamente eficazes: se seguidos corretamente, tornam a carga viral indetectável e, portanto, o vírus intransmissível.

“Ao longo da minha carreira, vi muitas mulheres que se isolaram por medo ou vergonha. Mas com o tratamento adequado, elas podem retomar sua vida afetiva e sexual de forma segura – inclusive sem risco de transmissão para um novo parceiro”, diz.

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O médico então aponta novos cenários, tanto para as infectadas na terceira idade quanto para as mais jovens. “Hoje, uma pessoa que vive com HIV no Brasil, o cenário é muito mais favorável do que era há alguns anos atrás. Ou seja, se ela, de forma responsável, procurar um atendimento especializado, tomar suas medicações de forma correta, essa pessoa vai ter uma vida normal.”

Por fim, Roberto faz um apelo à conscientização dentro das famílias: “Conversem com as pessoas próximas e compartilhem essa informação. Vocês podem estar salvando vidas e oferecendo qualidade de vida a quem sofre calada, por vergonha – mesmo que ela seja absolutamente desnecessária.”

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